Lucélia Muniz
Ubuntu Notícias, 20 de maio de 2019
Por Joelmir Pinho
Senhor Ministro,
Tenho acompanhado com especial interesse os atos e as falas de vossa
excelência, inclusive sua participação na audiência pública da Comissão de
Educação, Cultura e Esportes do Senado e na audiência convocada pelo plenário
da Câmara dos Deputados, realizadas nos dias 7 e 15 deste mês, respectivamente.
De modo especial, causa-me desconforto ver a
educação do meu país sendo tratada, quase que exclusivamente, sob a lógica fria
e indiferente das análises numéricas e estatísticas, a partir de planilhas de
excel, para usar uma expressão recorrente nas suas falas. Dentro dessa
perspectiva, por diversas vezes o senhor afirmou que dois mais dois é igual a
quatro, atribuindo à afirmação uma perspectiva absoluta, inquestionável e
imutável.
Pois bem, senhor Ministro. Os meus mais de trinta anos de militância na
educação formal e informal me ensinaram que quando olhamos para as pessoas numa
perspectiva solidária e quando colocamos a pedagogia à frente e acima da lógica
gerencialista dos números, descobrimos facilmente que dois mais dois será
sempre maior que quatro. É impossível mensurar os resultados da soma dos
saberes, dos fazeres, das histórias de vida e dos sonhos de pessoas de toda e
qualquer idade e de qualquer parte do nosso imenso Brasil pela lógica fria e
calculista que parece mover sua visão de mundo. As sinergias geradas pelos
esforços individuais e coletivos de educadores e educadoras, gestores e
gestoras, servidores técnicos e estudantes, espalhados por milhares de
instituições de ensino e comunidades de todo o país colocam por terra essa
visão limitada e limitante de educação apresentada por vossa senhoria.
Aliás, a demonstração mais clara de que o senhor
está errado na sua matemática vem dos efeitos das manifestações que tomaram
conta do Brasil no dia 15 último, ampliando significativamente a rejeição aos
cortes anunciados por vossa senhoria para a educação. E me refiro aqui não
apenas àqueles que atingem diretamente as instituições de ensino superior, mais
aos que afetam também a educação básica, o que faz desmoronar sua tentativa de
vilanizar o ensino superior e jogá-lo contra aquela modalidade de educação.
Imagino, Ministro, que senhor já tenha entendido que as manifestações
das ruas e suas reverberações pelo Brasil e pelo mundo não cabem nas planilhas
eletrônicas com as quais o senhor tenta justificar a insanidade das medidas do
governo do qual o senhor faz parte, agravadas pela chantagem desmedida e
descabida de vossa excelência, de seu colega ministro da Economia e de seus
aliados, que tentam, a todo custo e sem qualquer razoabilidade, vincular a
liberação futura de recursos para a Educação à aprovação da já derrotada PEC
06/2019, através da qual o atual [des]governo tenta nos impor o desmonte da
Previdência Social como política social e direito constitucional integrante do
tripé da seguridade social.
Ademais, na condição de ministro de Estado, o senhor tem o dever moral
de explicar à sociedade o lamentável episódio da ligação do presidente da
República para vossa senhoria no dia 14 de maio, tornada pública por
parlamentares da própria base aliada do governo, através da qual o presidente
teria ordenado à vossa senhoria [por telefone], na presença de vários
parlamentares, a suspensão dos bloqueios de recursos para a educação. Como
já é público, a informação foi desmentida logo em seguida pela Casa Civil e o
mal-estar se instalou geral, repercutindo, inclusive, durante a sua presença na
Câmara dos Deputados no dia seguinte. De todo esse lamentável episódio ficou só
uma certeza: alguém mentiu ao país. Além disso, do ocorrido ficaram
algumas dúvidas muito preocupantes como, por exemplo, qual o real poder do
atual presidente da República? E mais: a quem o senhor está subordinado de fato
[ao presidente da República, ao ministro da Casa Civil, ao ministro da
Economia]? Quem, realmente, comanda o atual governo?
Outra séria questão se refere às declarações do presidente Jair
Bolsonaro durante a presença do mesmo em Dallas [EUA], que qualificou os
milhares de participantes das manifestações do último dia 15, de idiotas úteis.
Além de desejar saber se o senhor concorda com o seu presidente, recorro aqui à
explicação do professor e filósofo Mario Sérgio Cortella, para lembrar que os
gregos, há dois mil e quinhentos anos, definiam como idiota [idiótes] “a
pessoa que não participava da vida coletiva, que olhava só o próprio umbigo,
que só cuidava do próprio nariz e dos próprios interesses”. Creio oportuno que
o senhor, como ministro da Educação, lembre ao seu presidente que, tomando por
base a etimologia da palavra, definitivamente, as pessoas que foram às ruas no
último dia 15 – e que voltarão a elas tantas vezes seja necessário para
defender o bem comum e os interesses coletivos – não são idiotas. Aliás, a
partir da didática explicação do professor Cortella, fica fácil identificar
onde estão alguns dos principais idiotas desse país atualmente.
Por fim, senhor Ministro, permita-me lhe dizer o obvio. Falta-lhe
sensibilidade, conhecimento técnico, liderança, visão pedagógica e condições
morais para continuar como ministro da Educação e sua permanência no cargo
representa um desserviço ao Brasil e uma séria ameaça ao presente e ao futuro
da nossa educação.
Joelmir
Pinho é professor substituto do curso de
Administração Pública da Universidade Federal do Cariri [UFCA]. Blogueiro,
curioso e eterno aprendiz, é também associado fundador da Escola de Políticas
Públicas e Cidadania Ativa [EPUCA].
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